'Pedágio' para aviões em São Paulo causa polêmica entre pilotos e aeroporto

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Uma cobrança inédita está causando dor de cabeça para pilotos e passageiros que usam o aeroporto de Sorocaba, no interior de São Paulo. A concessionária do local instalou um portão na pista de acesso a diversos hangares e cobra os operadores ao passarem por ele rumo às empresas no local. A cobrança chegava a R$ 343,90 a cada vez que um avião passasse por ali, aumentando os custos da operação e afastando clientes das empresas de manutenção instaladas em uma área particular do aeroporto. A barreira já causou um acidente, e operadores deixaram de realizar manutenções no aeroporto pelo custo.
No dia 5 de maio, em caráter liminar, uma decisão da Justiça determinou que a Voa-SP se abstenha de cobrar pela passagem entre as áreas do aeroporto, sob pena de R$ 5 mil de multa diária. A operadora, no entanto, disse que irá recorrer.
Área pública X Área privada

O aeroporto de Sorocaba está sob concessão para a rede Voa São Paulo, que também administra outros aeroportos no estado, e tem o nome de Bertram Luiz Leupolz. Apesar de não operar voos comerciais regulares, é base de diversas empresas de manutenção e serviços, como a Voar Aviation, Pratt & Whitney e a Embraer. Apenas em abril de 2025 foram 1.504 operações de pouso e decolagem, colocando-o como o 46º aeródromo mais movimentado do país.
Mas a divisão de seu espaço é onde está o problema. A área pública do aeroporto está concedida para a Voa-SP. Uma parte menor, próxima a uma das cabeceiras da pista, entretanto, é particular, mas totalmente integrada ao sítio aeroportuário, e está ali desde a década de 1960.
Ali ficam diversos hangares de empresas de manutenção e táxi-aéreo, ao lado do Aeroclube de Sorocaba e de uma base do grupamento aéreo da Polícia Militar de São Paulo, o Águia. Um portão e uma cancela foram instalados, justamente, na conexão entre essas duas áreas, e, a cada passagem, é cobrado um valor que tem sido centro de polêmicas.
A Aprohapas (Associação dos Proprietarios, Permissionários e Operadores de Hangares do Aeroporto de Sorocaba) vem defendendo o direito ao livre acesso, já que nunca foi cobrada a passagem e a área particular fica junto ao sítio aeroportuário. "É um direito adquirido de 65 anos que, quando a concessionária assumiu, quis mudar como se fosse a casa dela", diz o comandante Paulo Oliveira, presidente da Aprohapas.
Como funciona?

O piloto, ao pousar, se direciona à cancela ou ao portão, duas das vias que dão acesso à área particular e desliga o motor da aeronave. Ali, ele teria de acionar a administradora do aeroporto para obter uma chave Pix ou usar um QR Code para pagar o valor R$ 343,90, por isso o local tem sido chamado de pedágio.
Toda a coordenação é feita via rádio, o que, frequentemente, dura mais de 10 minutos, segundo relatos dos pilotos que operam no local. Uma vez que o pagamento era confirmado, o portão era aberto de maneira remota para que o piloto pudesse passar rumo ao seu destino. Entretanto, ele não poderia fazer isso por conta própria.
Uma exigência era a de que ele fosse rebocado, até mesmo pelo fato de que o tempo para acionar o motor seria muito longo para percorrer os poucos metros faltantes até o destino. Na saída, a aeronave teria de ser rebocada até o ponto de controle, e, após um novo pagamento, seria liberada para sair da área e ir para a pista decolar.
Ocorre que a cada pouso e decolagem já é paga uma tarifa para o administrador do aeroporto, e os associados da Aprohapas criticam que isso seria uma cobrança dupla, até mesmo pelo fato de que a manutenção da área privada é feita pelos seus próprios integrantes, e não pela Voa-SP.
O que a Justiça decidiu?

O histórico jurídico é antigo. Segundo Paulo Oliveira, a medida já havia sido barrada anteriormente quando o Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de São Paulo) ainda administrava o aeroporto. À época, a Justiça determinou que a cobrança era ilegal e abusiva, já que o órgão estaria cobrando duas vezes pelo mesmo fator.
Assim, a cancela ficou aberta com a passagem livre entre as duas áreas do aeroporto desde 2020. Mas, mesmo com decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), a cobrança voltou anos depois.
Em 2024, obras na barreira entre as áreas pública e privada do aeroporto voltaram a ser polêmica. Já a partir de maio de 2025, a cobrança voltou a ser realizada a título de ressarcimento de custos operacionais e devido à internacionalização do aeroporto, que foi barrada em um primeiro momento e, agora, está sendo tratada na esfera política.
Diante da notícia, diversos operadores anunciaram que deixariam de realizar serviços de manutenção no aeroporto do interior paulista, já que se recusavam a pagar tarifas extras além da de pouso e decolagem, única cobrada na ampla maioria dos aeroportos do mundo. Diante disso, investimentos milionários também deixariam de ser realizados nas empresas sediadas no aeroporto, segundo processo judicial movido pela Aprohapas.
No dia 5 de maio, em caráter liminar, uma decisão da Justiça determinou que a Voa-SP se abstenha de cobrar pela passagem entre as áreas pública e privada do aeroporto, sob pena de R$ 5 mil de multa diária.
A operadora do local está recorrendo da decisão e disse que não irá comentar sobre o caso.
O que diz a Anac?
Consultada, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) informou que não há exigência de homologação específica dos mecanismos eventualmente utilizados no controle de acesso entre áreas públicas e privadas do sítio aeroportuário em Sorocaba.
Ainda segundo a agência, é legítimo o uso de barreiras físicas que tenham o objetivo de preservar a segurança das operações aéreas "desde que o operador assegure que o acesso seja efetivamente controlado e limitado a pessoas, veículos e cargas autorizadas".
Sobre a internacionalização do terminal, Anac recebeu no início de 2025 um pedido para internacionalização do terminal, mas foram encontradas pendências na documentação apresentada. Até o momento, "não houve retorno nem envio de novos documentos para dar continuidade à análise do processo", informa a agência.
Barreira causou incidente milionário

Em 2023, antes ainda da cobrança, a barreira de acesso chegou a causar um incidente envolvendo uma aeronave King Air. O preço para o conserto do avião chegou a quase R$ 1 milhão de reais.
Em agosto daquele ano, por volta das 18h23 do dia 16, o avião se aproximou da barreira, que estava fechada, mesmo sem a cobrança estar instituída. Durante a abertura da passagem, a cancela bateu nas hélices da aeronave, causando parada brusca dos dois motores.
O avião se dirigia à empresa Conal para uma manutenção, e acabou ficando parada por vários dias até concluir a manutenção.
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