Todos a Bordo

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Reportagem

A tecnologia brasileira que evita que carros batam em aviões nos aeroportos

Uma tecnologia criada no Brasil está auxiliando a segurança operacional nos aeroportos pelo país. Esse sistema cria uma espécie de barreira virtual para evitar que veículos usados pelas concessionárias entrem nas pistas por engano e fiquem no caminho dos aviões.

O termo incursão em pista é usado nessas situações, e significa quando veículos, aeronaves ou pessoas entram indevidamente na área ativa de pousos e decolagens.

Essas situações são raras, mas podem ter consequências graves. Em fevereiro deste ano, um carro de manutenção foi atingido por um avião da Gol no Aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro. O veículo ficou destruído, mas ninguém ficou ferido.

Esse acidente escancarou os riscos da movimentação em áreas críticas dos aeroportos e, por pouco, não poderia ter se transformado em uma tragédia.

Barreira extra

RIVB: Dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos
RIVB: Dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos Imagem: Alexandre Saconi

O sistema se chama RIVB (Runway Incursion Virtual Barrier), que pode ser traduzido como Barreira Virtual contra Incursão em Pista, e funciona como uma barreira virtual que ajuda a evitar esse tipo de ocorrência.

Ele é instalado diretamente nas viaturas que circulam nas áreas de manobra dos aeroportos, como as pistas de pouso e decolagem, os pátios e as pistas de taxiamento (chamadas de taxiways).

Seu funcionamento se dá com a atuação conjunta de sensores, GPS, alertas sonoros e visuais. Quando o veículo se aproxima de uma zona de risco, como o eixo da pista, o sistema emite alertas luminosos e sonoros que aumentam de intensidade conforme a distância diminui.

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O RIVB foi desenvolvido pela equipe do aeroporto de São Luís (MA), operado pela Motiva, antiga CCR Aeroportos. "O sistema tem a funcionalidade de criar mais uma barreira de segurança para evitarmos incursão em pista", explica Marcelo Angelim, gerente do aeroporto.

O executivo explica que o sistema tem quatro níveis de alerta visual por meio de leds instalados no aparelho, que fica no painel das viaturas:

  • Luz verde: Livre para circulação
  • Luz amarela: Alerta a 150 metros de distância do eixo central da pista
  • Luz vermelha: A viatura está na área crítica da pista
  • Luz azul Acende quando o alerta sonoro é silenciado pelo operador

O aparelho ainda conta com uma tela que mostra em tempo real a distância em metros até o centro da pista. Com isso, os operadores podem ter certeza de que estão a uma distância segura e que não estão na pista errada, por exemplo.

Criação brasileira

RIVB: Primeira versão era maior e funcionava com outra tecnologia
RIVB: Primeira versão era maior e funcionava com outra tecnologia Imagem: Alexandre Saconi
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O projeto nasceu dentro do próprio aeroporto de São Luís, em 2022, idealizado pelo então gerente da unidade. Ele propôs o desafio de criar um sistema de baixo custo que reforçasse a segurança das operações. A partir disso, a equipe técnica passou a desenvolver o protótipo com tecnologias acessíveis e de fácil implementação.

"O equipamento surgiu de uma ideia do time. Utilizamos tecnologia comparável ao Arduino, de prototipagem, barata e fácil de adquirir", detalha João Arrais, coordenador de manutenção do aeroporto. O sistema é composto por uma carcaça, um microcontrolador ESP32, um display de distância, LEDs e um alarme sonoro. Todo o conjunto cabe em um invólucro compacto que pode ser facilmente instalado nas viaturas operacionais e, hoje, é feito por meio de impressão 3D.

Segundo Angelim, o RIVB não substitui os sistemas tradicionais, mas os complementa. "Ele não foi criado para substituir absolutamente nada. Veio apenas para agregar mais valor à segurança, somando-se aos demais elementos do sistema de proteção dos aeroportos", afirma o gerente do aeroporto.

RIVB: Evolução das versões resultam em dispositivos menores
RIVB: Evolução das versões resultam em dispositivos menores Imagem: Alexandre Saconi

A primeira aplicação do RIVB foi no próprio Aeroporto de São Luís, onde passou por meses de testes e ajustes. Desde então, a tecnologia entrou em operação assistida também nos aeroportos de Bacacheri (PR), Joinville (SC), Navegantes (SC) e Curitiba, todos administrados pela Motiva. Segundo a empresa, o plano é expandir para todos os 16 aeroportos operados pela empresa no Brasil.

Como é feita a coordenação?

Para entrar na pista, geralmente, os operadores dos aeroportos têm de pedir autorização para as torres de controle. Cada processo varia de acordo com quem administra o aeroporto.

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Em alguns casos, as equipes das viaturas fazem o pedido diretamente para os controladores, usando uma linguagem aeronáutica específica. Em outras situações, quem está no carro tem de avisar sua empresa que irá entrar em alguma área restrita à sua circulação, e ela é quem faz a coordenação com a torre do aeroporto.

Em todas as situações, é importante conhecer a linguagem utilizada na fonia aérea. Até mesmo para evitar acidentes: se um motorista estiver na pista e ouvir via rádio que ela está com um pouso autorizado, deve sair dali quanto antes, pois alguma coisa deu errado para permitir sua permanência no local.

Por que viaturas entram na pista?

Em São Luís, a operação diária exige ao menos duas inspeções completas na pista por turno de trabalho. Nessas rondas, os agentes verificam o estado do pavimento, o balizamento, placas de sinalização e barreiras patrimoniais. "A gente verifica as barreiras para evitar o ingresso de animais ou pessoas não autorizadas dentro do complexo de pista", afirma Marcelo Angelim.

RIVB: Dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos
RIVB: Dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos Imagem: Alexandre Saconi

Esse tipo de inspeção é comum em todos os aeroportos, que também precisam verificar se não há nenhum objeto estranho nas pistas, se não há buracos ou deformidades no asfalto, entre outras tarefas. Esse ingresso é feito em coordenação com as torres de controle de cada local, que deve assegurar que, quando um avião estiver se aproximando, não haverá nenhuma viatura no local e vice-versa.

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Segundo Angelim, o sistema já está plenamente integrado à rotina operacional e tem contribuído para aumentar a consciência situacional dos condutores. "O equipamento mostra para o motorista, a cada quantidade de metros percorridos, a distância em que ele se encontra do eixo da pista."

Tecnologia em expansão

Aeroporto de São Luís usa RIVB, dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos
Aeroporto de São Luís usa RIVB, dispositivo evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos Imagem: Alexandre Saconi

A Motiva pretende seguir evoluindo a tecnologia. Um dos próximos passos será integrar o sistema a um painel central na sala de comando do aeroporto, que permita acompanhar em tempo real a localização das viaturas, suas velocidades e o histórico de movimentações. A ideia é que o supervisor do aeroporto tenha uma visão completa da operação, com dados que ajudem na tomada de decisões preventivas.

Além disso, há planos de reduzir ainda mais o tamanho físico do módulo, para facilitar a instalação e torná-lo mais discreto. O sistema ainda foi desenvolvido com base em uma filosofia de código aberto.

Isso significa que o modelo pode ser adaptado e implementado por outros aeroportos, públicos ou privados, que desejem adotar a tecnologia.

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RIVB: Dispositivo que evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos foi desenvolvido pela equipe do aeroporto de São Luís
RIVB: Dispositivo que evita acidentes com entrada inadvertida de viaturas em pistas de aeroportos foi desenvolvido pela equipe do aeroporto de São Luís Imagem: Alexandre Saconi
Aeroporto de São Luís: Mais segurança na operação dos aeroportos resultam em melhor atendimento e menos atrasos dos voos
Aeroporto de São Luís: Mais segurança na operação dos aeroportos resultam em melhor atendimento e menos atrasos dos voos Imagem: Alexandre Saconi

* O colunista viajou a convite da Motiva, ex-CCR Aeroportos

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